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Analisando letra: O Poeta está vivo - Barão Vermelho


Aos leitores Rebobinantes, meu olá. Bom galera, depois de uma via-crúcis da telefonia(risos), estou de volta com a primeira postagem do ano. E eu não poderia começar diferente, já que o analisando letra é um dos meus tópicos preferidos aqui do Rebobinando. Neste analisando letra, trago uma canção que na minha opinião é uma das melhores já composta, principalmente pela profundidade e veracidade de sua letra, mas não vou ficar aqui tecendo elogios e dizendo o quanto gosto dessa canção, ou algo do tipo como sempre faço. Vamos logo ao que interessa, até por que, as informações são muitas e eu não quero escrever aqui nenhum sermão da montanha (risos).

A musica tem letra de Dulce Quental e melodia de Frejat, mas antes de começar, você precisa saber que, goste você ou não, concorde você ou não, essa canção foi composta com o intuito de homenagear Cazuza, que havia voltado de Boston depois de uma "quase morte". Dulce fez a letra para estrelar a volta do Poeta. Entretanto, a letra demorou um pouco a ser musicada e o Barão lançou só depois do falecimento de Cazuza. Frejat sempre diz que ela se direciona a todos os poetas, e eu acho até que sim, mas nasceu com pensamento em Cazuza, como afirma o próprio Frejat.

Frejat: A idéia desta música é a de que o poeta está vivo. No caso desta música é um caso curioso, pois ela foi composta para celebrar a volta de Cazuza que havia ido para Boston e havia passado por uma crise de saúde muito grande e quase morreu. Quando ele voltou estávamos muito felizes por ele estar vivo. Foi feita para celebrar este retorno positivo. Só que quando ela foi lançada ele já havia falecido, mas ele ouviu a música antes de ser lançada. Depois que ele morreu ela passou a ter outro sentido, pois aí seria o poeta que continua vivo na memória de todos nós.  

Entrevista dada a Radio UOL em 17/10/2008 onde Frejat respondeu perguntas dos ouvintes

Claro que a poesia é livre, e não se prende a um único propósito ou segue um só conceito ou pensamento, a poesia sempre se torna maior que o próprio propósito pelo qual foi concebida. Nas minhas pesquisas, encontrei interpretações que diziam que essa canção falava de Jejus Cristo, outra que falava que a música está diretamente relacionada ao período de mudança no Renascimento Cultural por ai vai, e o mais curioso, é que, qual quer direção que tome a linha de interpretação, no final sempre acaba fazendo algum sentido, é realmente incrível a grandeza que toma uma poesia, mas na minha analise vou me abster somente ao propósito com o qual a canção foi composta, a homenagem ao poeta Cazuza.

Bom, dito isto, vamos a analise:

Analisando letra: O Poeta está vivo
Dulce Quental / Frejat



Baby, compra o jornal
E vem ver o sol
Ele continua a brilhar
Apesar de tanta barbaridade...
Nesses versos, o eu lírico faz um convite a viver a vida, a continuar em frente, não importando o quão maus sejam os dias, isso não apagará a beleza que é viver.

Baby escuta o galo cantar
A aurora dos nossos tempos
Não é hora de chorar
Amanheceu o pensamento...
Ainda nesses versos, a ideia do valor a vida fica ainda mas clara, na importância que o eu lírico da ao cantar do galo, ao amanhecer diário. O eu lirico fala a alguém que chora, mostrando-lhe a importância da renovação, da mudança de ideias de posturas e atitudes. Essa canção foi composta em uma época em que o Brasil estava tentando se encontrar, se encaixar, vivia-se um período pós ditadura, e as ideias de renovação, esperança e futuro melhor eram difundidas, havia toda uma nova ideia no ar, não era hora de chorar, sofrer ou se lamentar, o pensamento amanheceu, se renovou e era preciso ter esperança no amanhã.
(Sabendo que a canção foi feita para Cazuza, fica fácil entender que o autor o incentivava a não desistir ou se entregar, pois eram novos tempos e havia muito a ser feito e vivido)

O poeta está vivo
Com seus moinhos de vento
A impulsionar
A grande roda da história...
Aqui a celebração ao poeta (Cazuza) que estava vivo, com seus delírios, loucuras e poesia, fazendo referencia a Dom Quixote que em seus delírios transformava moinhos de ventos em gigantes. Cazuza transformava seus delírios e loucuras em poesia e arte, que inflama, que toca os corações que muda pensamentos que impulsiona e faz a grande roda da história girar. A canção foi feita para Cazuza, ainda em vida, mas após seu falecimento o sentido da canção mudou, dando o sentido de otimismo, de que o poeta estava vivo dentro de nós, em suas obras e legado. Em um trecho do livro Letra, musica e outras conversas, do cantor Leoni, Frejat fala um pouco mais sobre a canção.
(Leoni)"L.-"O poeta está vivo" foi escrita pro Cazuza?
(Frejat) F.- Foi escrita pro Cazuza antes dele morrer, muito antes. Ela foi escrita em 88 justamente porque ele estava vivo. Ele tinha ido pra Boston, esteve muito mal lá e voltou vivo. A Dulce foi visitá-lo, ficou feliz e escreveu essa letra. Só que a gente só gravou em 90. Ele chegou a ir no estúdio na época em que a gente estava gravando o disco - não sei se chegou a ouvir essa música. Logo depois que a gente gravou, o disco tinha sido terminado, ele faleceu. Com isso a música passou a ter outro significado, mudou completamente de sentido.

(Leoni)  L.- Em geral as pessoas acham que foi um réquiem.
(Frejat) F.- Mas não é. Seria uma coisa meio oportunista se tivesse sido feita depois. Apesar de eu achar que quando você gosta muito de uma pessoa, fazer uma música em homenagem a ela depois que ela morre não é oportunismo."
(Trecho do livro, Letra, musica e outras conversas - Leoni)
Mas quem tem coragem de ouvir
Amanheceu o pensamento
Que vai mudar o mundo
Com seus moinhos de vento...
Já nesse trecho, o autor nos faz um convite a revolução permanente, a capacidade de transformar, ver com novos olhos, de se aceitar e se permitir. Mas nem todos estão aptos a ouvir novos pensamentos, estão abertos a novas ideias.
"Trechos da música, nos remete as obras, "A divina Comédia" e "Dom Quixote", Na obra Dom Quixote De La Mancha de Miguel S. Cervantes, também notamos uma forte presença do imaginário, de algo surreal, acima de qualquer coisa, que foi a grande “loucura” de Dom Quixote. Que criou um mundo totalmente imaginário a partir de livros. Está obra possui importantes trechos, dentre eles se destaca a “A Batalha dos Moinhos de Vento” onde Dom Quixote encontra-se com moinhos e acredita cegamente que estes são cavaleiros e gigantes. 
(Em outras palavras, quem tem coragem de assumir uma nova postura, de ir contra a conceitos pré determinados por essa sociedade e a partir de seus sonhos, imaginação, delírios e loucuras tentar mudar o mundo de alguma forma, como o poeta)

Se você não pode ser forte
Seja pelo menos humana
Quando o papa e seu rebanho chegar
Não tenha pena...
Já aqui, ainda com a ideia de que o eu lirico fala há alguém, ele expressa e necessidade de humanidade para lidar com situações adversas e diferenças, e não julgar, não ferir, não magoar, já que a força nem sempre se faz presente. O poeta (Cazuza) sempre foi muito criticado, principalmente por parte dos religiosos por seu estilo de vida que culminou na sua condição de doente, isso nos dar o entendimento de que essa humanidade que o eu lirico pede, pode ser também, por parte daqueles que nunca tiveram força para aceitar ou entender o poeta ( Cazuza), e que por vezes, o julgaram e o ofenderam (no caso a Igreja Católica, já que ele fala do papa). E critica essa mesma igreja e seu pensamento contrário ao uso de camisinha e sua postura reacionária e obscurantista em relação ao sexo, já que o poeta (Cazuza), considerava o sexo um dos maiores prazeres do mundo.  

Todo mundo é parecido
Quando sente dor
Mas nú e só ao meio dia
Só quem está pronto pro amor...
Aqui a aversão ao preconceito que falamos a cima, é ainda mais clara, o autor nos faz lembrar que todos somos iguais, não importa a cor, credo, opção sexual ou classe social, e é justamente na dor, que isso fica mais claro, sofrimento é sofrimento não importa seu nível social. Esse verso, também nos fala do preço que se paga por amar incondicionalmente, ser intenso, sonhador, como Dom Quixote em seus devaneios. O preço é estar exposto, “nú e só ao meio dia”.

O poeta não morreu
Foi ao inferno e voltou
Conheceu os jardins do Éden
E nos contou...
Nessa estrofe, o autor faz referencia a obra “A Divina Comédia” de Dante Alighieri que conta a história de Dante que se encontra perdido no meio da selva cercado por feras, até que o espírito de Virgílio vai a seu encontro para ajudá-lo. Virgílio propõem um caminho para Dante onde passam pelo inferno, pelo purgatório e pelo céu. Com essa referencia o autor compara Dante de “A Divina Comédia”, com o próprio poeta (Cazuza), que voltará de Boston depois de uma quase morte.
 Após a volta de Boston, Cazuza compôs a canção "Boas Novas", em que diz que "viu a cara da morte e ela estava viva", "O Poeta não morreu, foi ao inferno, conheceu os jardins do Éden e nos contou", Cazuza quase morreu e nos contou sua experiência na letra da canção "Boas Novas".

A respeito disso Frejat diz:
Cazuza havia voltado de Boston, e composto o "Boas Novas", era uma volta depois de uma "quase morte". Dulce fez a letra para estrelar a volta do Poeta.
No mais, a canção se repete

Dulce Quental a autora desta letra, relata em seu blog Caleidoscópicas, como se deu a composição da mesma


Inspirada na letra de Boas Novas compus O Poeta está vivo. Sem musica ainda, mostrei a letra pra ele (Cazuza), meio envergonhada de pretender escrever alguma coisa à altura da sua verve e do seu sofrimento. Estávamos no apartamento da Lagoa. Ele escutou atentamente e disse: “você está escrevendo melhor do que eu”. Eu sabia que não, mas esse era o Cazuza: um cara que sabia dizer o que as pessoas precisavam ouvir.


                                  
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E para encerrar, o clip da canção, até a próxima pessoal

23 Comentários:

Vanessa Barbosa rebobinou e disse...

Eu estou muito feliz em dizer "Você está vivo!" rsrsrs. Sumiu hein moço..
Beijos e tenha uma quinta-feira iluminada.

Anônimo rebobinou e disse...

Oi,Marcos.

Que post excelente!

Gosto demais do Barão e vc conseguiu muito material.

Seu blog está nos meus favoritos!

Que bom que voltou.

Linda semana.

Bjs

Donetzka

Paty L. rebobinou e disse...

Essa canção é linda mesmo!
Cazuza era uma pessoa humana (diferente de alguns religiosos).
Vou ouvir só pra matar a saudade da música.

Uma Interessante Vida rebobinou e disse...

Que bom voltou, Marcos! E voltou em grande estilo, pois Frejat é um excelente cantor, gostei da análise que você fez sobre a música. beijos

Milene Lima rebobinou e disse...

É linda e eterna. Arrepiante desde o "baby" inicial até a última nota.

Eu também pensei que a letra houvesse sido escrita depois da morte do Cazuza,mas agora confesso que acho a história ainda mais linda.

Belíssima escolha, rapaz!
Beijo e seja bem voltado, como diz meu amigo Rodolfo.

esquerdalight.blogspot.com rebobinou e disse...

Ótima análise, principalmente porque há uma contextualização...

BLOGZOOM rebobinou e disse...

Querido Marcos,

Eu sou a Fada Lanterninha, mas colocando leituras, visitas, comentarios e respostas em dia.
Queria usar a varinha, mas é proibido.... sendo assim, arregaçar as mangas e ir em frente! rsss

Beijos

Vera Lúcia rebobinou e disse...


Oi Marcos,

Que bom que está de volta.
Nunca havia prestado atenção na letra desta música. Agora, após sua bela e minuciosa análise, vejo que é uma letra muito interessante e rica em seus significados e homenagem.

Parabéns pelo excelente trabalho.

Abraço.

Felisberto T. Nagata rebobinou e disse...

Olá!Bom dia!
Marcos
Bom retorno!
...muito boa a análise da letra.Tudo que eu fosse querer acrescentar seria obviedade a mais.Só posso dizer o óbvio:Salve Barão, Salve Cazuza! Eterno exagerado, eterno poeta… Parabéns!
Bela quinta feira!

Abraços
ClicAki Blog(IN)FELIZ

Sérgio Santos rebobinou e disse...

Ainda bem que resolveu, pelo menos por enquanto, os problemas, Marcos. E veja, coincidentemente, hoje o Barão Vermelho se apresentou no BBB. Muito bom o post. abraços

Jacques rebobinou e disse...

Olá, Marcos.
Cazuza foi um dos grandes poetas de sua época e sua obra está imortalizada em suas letras e canções, como deve ser feito com todos aqueles que ousam viver a vida intensamente e sem se importar com a opinião alheia.
Excelente análise, como sempre.
Abraço.

Rosa Azul Simone dos Passos rebobinou e disse...

Boa tarde Marcos e seja bem vindo!
Adorei ler teu post., inteligente,
direto e sensível. Sim, acredito que
poetas não morrem e sabe porque?
Porque a Vida seria um tédio, sem cor...
O poeta vive e sobrevive nos corações
sensibilizados de pessoas que ainda,
conseguem arrancar beleza na simplicidade
do concreto, na tristeza de ver nossa
Natureza morrendo um pouco a cada dia.
Ao sentir a violência sempre a flor da pele,
sensível poeta chora e sofre.
Infelizmente, existem poetas que escrevem
muito bem quando estão sofrendo, triste mas real! E mesmo quando sua poesia fala da sua gente,
sua historia, sempre haverá algo que faz doer.
Mas a Vida é assim, altos e baixos...Abraços e
obrigada pela visita gentil.

Verinha rebobinou e disse...

Olá Marcos vim retribuir o carinho da visita, adorei seu comentário em meu post, disse tudo. Já estive aqui, fazendo reconhecimento, estou te seguindo também, porque adorei seu blog e de cara fiquei por dentro desta musica tão linda, não tinha o conhecimento de que ela foi escrita para o Cazuza. Gosto muito do Barrão Vermelho, Cazuza e tantas bandas que fazem musicas com conteúdo. Com certeza os poetas não morrem, vivem em suas poesias, essas que não sai da mente e que aquecem o coração.
É um prazer estar aqui.
Um fim de semana perfeito.
Beijinhos.
Eternamente VV

Angelus rebobinou e disse...

Oi Marcos, tudo bom?
Estou voltando só agora a ativa e revisitando os amigos.
Eu já conhecia essa música, mas não seus significados. A gente vai percebendo como a análise vai se encaixando e o duplo significado da letra, pré-morte e pós-morte do poeta.

Tenha um ótimo 2013.Abração!

Anônimo rebobinou e disse...

Depois dessa analise, eu descobri que não sabia nada sobre essa musica e sua interpretação, perfeito, parabéns pelo excelente trabalho. Eu viajava na maionese quando tentava decifrar essa canção.

C.G

Elaine Regina rebobinou e disse...

Poxa, muito massa, Marcos! Você sempre escolhe temas e músicas super legais.

Parabéns pelo cuidado com o conteúdo dos posts.

Beijos!

Amigos de Bolso rebobinou e disse...

Demais!!! Absolutamente lindo o texto acima e a história do nascimento desta canção. Cazuza foi realmente um grande poeta e foi lindamente homenageado por esta canção!

Anônimo rebobinou e disse...

Sem palavras para essa analise, encontrei o que procurava, seu espaço é realmente diferenciado em amigo

Anônimo rebobinou e disse...

suas interpretações são perfeitas, tanto na música do uns e outros como nesta do frejat.


Muito bom!

Sérgio Abreu - Angra dos Reis

Anônimo rebobinou e disse...

Eu entendia essa parte diferente: "O poeta não morreu
Foi ao inferno e voltou
Conheceu os jardins do Éden
E nos contou..."

Eu achava que era porque todo poeta sofre por amor ou por alguma coisa e expõe isso em palavras. Achava que o morrer seria quando num momento de sofrimento achamos que o fim. Aí na música diz que o poeta não morreu, foi ao inferno e voltou: porque ele sofreu, viveu seu inferno, mas voltou, encontrou sua paz e nos contou. Poetas sempre escrevem quando estão sofrendo, mas ele nao morrem, e encontram seu paraíso e nos contam suas experiências.

Unknown rebobinou e disse...

Eu pensava que essa música,tinha sido escrita após o falecimento do Cazuza,viajava na maionese. Nem gostava da letra, achava estranha, sem nexo. Mas agora com os esclarecimentos, meu pensamento mudou. Agora sinto empatia pela letra. Rs.

Unknown rebobinou e disse...

Gostei muito de sua interpretação e nas riquezas dessa maneira música

Unknown rebobinou e disse...

Que pobreza da análise dessa música sobre o contexto da Igreja Católica. Qual a base para falar em obscurantismo, reacionarismo e ofensas contra uma instituição que busca apenas preservar os seus dogmas? Será que se a letra fosse critica a determinados rituais do candomblé (como sacrifício de animais) ou do Islamismo (infinitamente mais radical do que o cristianismo) não teriam acusado de intolerância religiosa?

Sempre me impressiono sobre como é fácil criticar, atacar o ofender figuras e valores do cristianismo sem qualquer pudor ou consequência. Isso sim que me parece obscurantismo e fascismo!

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